Fragilizarmos a nossa fragilidade deixa-nos demasiado expostos ao vento forte da nossa existência. Tememos que o mesmo se torne incontrolável e nos arraste para tornados impossíveis de gerir.
No entanto, esta será sempre uma inevitabilidade, uma realidade do caminho, onde as águas nos obrigam a diluir o que já não nos pertence (quem sabe nunca antes pertenceu) e é nas profundezas que esta diluição aos poucos vai acontecendo, mesmo quando o oxigénio parece escassear e queremos a todo o custo vir à superfície para ver finalmente a luz.
Mas, haverá nascimento sem gestação?
Haverá gestação que não seja feita no escuro?
É nesse escuro, que perdidos nos encontraremos um dia.
Porém é lá também, que, uma vez encontrados, nos voltaremos a perder.
A impermanente e eterna ciclicidade da vida, o tema central de toda uma existência.
Nestes períodos de fragilidade a nossa sombra emerge.
Vinda das mais abissais profundezas, desconhecemo-la, querendo a todo o custo evitá-la.
Opomo-nos a ela, acreditando que a podemos vencer, esquecendo-nos de que, não é essa a sua função.
Na verdade, a sombra só existe onde existe luz.
Se repararmos, quando a luz encontra algum obstáculo no caminho, é impedida de prosseguir, então para continuar contorna ao redor esse mesmo obstáculo e é isso que produz uma área sem luz, a que comummente chamamos sombra.
Assim é, fora de nós, assim é dentro também.
Com a sua chegada, o nosso formato (des)formata-se e feridas outrora existentes e ainda não saradas, abrem-se dentro de nós como fendas numa parede.
Confusas não percebemos se – o tempo cura as feridas, ou se por outro lado tem o poder de ferir as curas.
Seja como for, até lhe percebermos a cor é duro dar-lhe as boas vindas.
Quando conseguimos fazê-lo e rendermo-nos aos seus ensinamentos, algo se move profundamente dentro de nós.
Finalmente podemos lapidar as nossas arestas e aprender valiosas lições escondidas nos seus recantos.