O QUE EM MIM PRECISA DE MIM

caminhar deserto

Gostaria de iniciar este texto com uma reflexão do escritor Ruben Alves, que diz o seguinte:

“Comecei a alimentar-me de silêncio.

Não basta no silêncio a ausência de pensamentos.

É preciso fazer silêncio dentro.

Quando comecei a fazer silêncio dentro, escutei coisas que nunca tinha escutado.”

Até mim, chegam na maior parte das vezes, mulheres feridas.

Algumas destas mulheres sabem da inexistência de analgésicos, quando a dor do abuso e do desamor lhes percorre células, e lhes tira tantas vezes, a vontade de viver.

Nestas alturas, o ruido interno torna-se insuportável, e só a possibilidade de silêncio, pode ser sinónimo de agudizar uma profunda solidão, sendo fácil cair na armadilha de fugir desse silêncio, acreditando que se o fizermos deixaremos de sentir dor.

Na verdade, é exatamente o oposto.

Contactarmos aquilo que nos dói, irá aliviar-nos no tempo certo, e regra geral, abre-nos mais espaço para encontrarmos paz, estrutura e força para atravessarmos os desertos com que nos deparamos.

Quando numa relação, experienciamos abuso, a nossa percepção do mundo fica comprometida, distorcida e a cronificação do stress vivido, pode tornar-se tão “normal” que o barulho interno pode ser absolutamente ensurdecedor.

Esta é a altura certa para sermos amáveis com nós mesmas e nos perguntarmos com honestidade:

– O que é que em mim, precisa de mim?

Esta resposta, como tantas outras na vida, pode não chegar de forma rápida, ou pelo menos com a rapidez com que desejaríamos. Precisamos paciência, confiança e autocompaixão, para irmos aos poucos resgatando as nossas partes estilhaçadas, através de reconhecer e de dar voz às nossas partes sãs, onde habita a nossa resiliência e os nossos recursos.

Quando o caos nos habita, buscarmo-nos a nós mesmas, é recorrer de forma sagrada, à força que a vulnerabilidade tem, permitindo-nos com abertura sermos acompanhadas, nutridas e amparadas, para não mais trilharmos caminhos tóxicos e desnivelados, e podermos vir a ser quem somos realmente.

E, apesar de no início do nosso processo habitar o silêncio, pode confundir-se com vazio, solidão e desespero, como diz Ruben Alves, quando dele nos começamos a alimentar, e percebemos que o mesmo é mais do que ausência de pensamentos, trazemos até nós essa possibilidade de com o silêncio que escutamos dentro, escutarmos coisas que nunca antes tínhamos escutado, através daquela voz só nossa, que tanto precisa de…nós!

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